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quinta-feira, 5 de junho de 2025

Guiné 61/74 - P26885: Questões politicamente (in)corretas (61): Aprendi a jogar xadrez com o meu comandante, Fernando Pires (1942-2024) (Luís Dias, ex-alf mil, CCAÇ 3491, Dulombi e Galomaro, 1972/74)

Foto à esquerda: O comandante-chefe, gen António Spínola, na inauguração das renovadas instalações do quartel do Dulombi, em abril de 1972. Em segundo  plano,  o cap mil art Fernando Pires (1942-2024), comandante da CCAÇ 3491 (Dulombi e Galomaro, 1972/74).

Foto (e legenda) © Luís Dias (2011). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].

1. Mensagem de Luís Dias (ex-alf mil at inf, CCAÇ 3491/BCAÇ 3872, Guiné, 24 de dezembro de 1971 a 28 de março de 1974).


Data - terça, 3/06/2025 23:06
Assunto - Xadrez (*)


Luís Dias
Não sou um grande jogador de xadrez e iniciei o meu conhecimento sobre este tão importante jogo, durante a minha estadia na Guiné, em especial no tempo que passei no Dulombi, entre fevereiro de 1972 e março de 1973. 

O meu professor foi o capitão da minha companhia (CCAÇ 3491), Fernando Pires (cap mil art, infelizmente já falecido) e foi com ele que pratiquei por largos meses. 

Ainda cheguei a jogar também com ele nos tempos que passei em Galomaro (sede da CCS do BCAÇ3872, ao qual pertencemos e para onde foi deslocada a maior parte da companhia, quando saímos do Dulombi, onde ficaram 13 elementos, comandados por 2 furriéis e ainda 2 pelotões de milícias), para reforçar a sede do Batalhão, após terem sofrido um forte ataque no dia 1 de dezembro de 1972, tendo ainda 1 Grupo de Combate de reforço ao Batalhão de Piche.

Estive durante a comissão em outros locais como: Bolama e S. João (no estágio das Unidades Africanas), Piche, Bambadinca (como comandante do CIM - Centro de Instrução Militar), Nova Lamego e Pirada, e em todos eles não vi, nem tive adversários para continuar a jogar, umas vezes talvez por falta de tempo, outras por não ter-me apercebido de que houvesse pessoal a jogar xadrez.

Ainda podia ter-me internacionalizado a jogar com um estrangeiro (o célebre Libanês, proprietário de um bom restaurante em Bafatá, que chegou a desafiar-me para um joguinho) mas não havia tempo para tal, pois era comer o belo bife à bota e regressar o mais depressa possível ao Dulombi, ou a Galomaro.

No regresso a Lisboa, ainda fiz alguns jogos com amigos, mas o prazer do jogo foi-se desvanecendo com a atividade laboral em que estava integrado e não jogo há já muitos e bons anos.

Um forte abraço, 
Luís Dias.

_____________________

Nota do editor:

(*) Último poste da série > 3 de junho de 2025 > Guiné 61/74 - P26876: Questões politicamente (in)corretas (60): Afinal o "tuga" também jogava xadrez no CTIG (José Belo /António Graça de Abreu / Carlos Vinhal / José Botelho Colaço / Ernestino Caniço / Eduardo Estrela)

terça-feira, 6 de maio de 2025

Guiné 61/74 - P26769: A nossa guerra em números (29): nos quartéis do mato, dentro do arame farpado, a malta consumia em média, por ano e "per capita" , 21 litros de... álcool puro (14 em vinho, 5,4 em cerveja, 1,6 em bebidas destiladas)... (Aníbal Silva / Luís Graça)



O Luís Dias, ex-alf mil,  CCAÇ 3491/BCAÇ 3872 (Dulombi e Galomaro, 1971/74) dizia-nos, em 2010, que ainda tinha lá em casa "5 garrafas de uísque das que trouxe da Guiné"... Eram elas "uma 'President', uma 'Something Special', uma 'Dimple', uma 'Smugler' e uma 'Logan' (conforme foto...). Umas autênticas belezas". (*)

E acrescentava:

 "Alguns dirão que isto é um sacrilégio; porque será que o Dias não tratou destas 'meninas' em conformidade? Outros dirão que não é lá muito de beber e que, por tal facto, foi deixando andá-las lá por casa. Eu respondo: fui bebendo algumas, deixei outras ao meu pai, também ao meu tio Armando – este sim um grande apreciador – e fui ficando com outras e, olhem, ganhei-lhes amizade, porque olhava para elas e ia-as destinando a grandes momentos. Bebi uma, já não me lembro a marca, quando o meu filho nasceu há 30 anos. (...) Vou abrir a 'Dimple' quando fizer 60 anos, se Deus permitir que eu lá chegue,  e as outras serão para outras 'special ocasions' ” (...).

Comentário do editor LG: A Dimple já se foi!... E não faltarão ainda essas ocasiões outras especiais: os 80, os 90, os 100 anos... O uísque bom e velho não se estraga...

Foto (e legenda): © Luís Dias (2010). . Todos os direitos reservados.[Edição e legendagem complementar: Blog Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Quais os artigos que mais se consumiam nas cantinas da tropa, no mato, na Guiné ?

Temos algumas indicações, a avaliar por uma pequena amostra das vendas (mensais)  na cantina da CCAV 2483 / BCAV 2867 (Nova Sintra e Tite, 1969/70), de acordo com os dados do balancete que nos foi fornecido pelo nosso camarada Aníbal José Soares da Silva, ex-fur mil vagomestre.(**)

Os dados respeitam às vendas no mês de maio de 1970. A companhia tinha 150 homens. Não havia subunidades adidas (a não ser um Pel Caç Nat no início da comissão). Por outro lado, só havia uma cantina / bar, embora houvesse refeitório (para as praças) e messe (para sargentos e oficiais).

Os artigos então mais vendidos foram (em unidades) (> 50):

  • Cerveja 0,3 l > 3977 (garrafas):
  • Tabaco Porto > 1034 (maços);
  • Coca-cola > 1402 (latas);
  • Tabaco SG > 754 (maços);               
  • Fósforos > 718 (caixas);
  • Leite c/ cacau 411 > 595 (embalagens);
  • Tabaco Português Suave > 395 (maços);
  • Cerveja 0,6 > 268 /garrafas);
  • Laranjada Shellys > 223 (latas);
  • Bacalhau > 96 (quilo ? embalagem ?);
  • Água Castelo > 65 (garrafas);
  • Sumol > 53 (garrafas ou latas);
  • Pilhas 1,5 v > 51


2, Se agruparmos estes itens por géneros (cerveja, tabaco, refrigentes, bebidas destiladas),  temos:


(i) Cerveja (0,3 l e 0,6 l) > 4245 garrafas (equivalente a 1353,9 l):

(ii) Tabaco (todas as marcas) > 2215 maços:

(iii) Refrigerantes (coca-coca e sumos) > 1680,5 (latas / embalagens)

(iv) Bebidas destiladas (uísque, gin, vodca, aguardente...) > 72,5 garrafas de 0,75l.


3. Admitindo que o mês de maio não era um mês "atípico" do ano, em matéria de consumo na cantina (estava-se no início da época das chuvas, já se saía menos vezes para o mato, embora no tempo seco, a partir de outubro, se pudesse beber mais cerveja...) podemos tentar calcular um valor médio anual "per capita" destas 4 categorias de bens consumidos:


(i) Cerveja:

  • 1353,9 l a dividir por 150 homens (=9,026 l) e a multiplicar por 12 meses, dá um consumo "per capita" anual de 108,3 l;
  • este valor pode estar subestimado; de qualquer modo, 108.3 l  "per capita" era já um valor seguramente muito superior à média nacional de 1970, e mais do dobro do consumo atual (em 2022, foi de 53 litros, segundo dados da European Beer Trends);

(ii) Tabaco:

  • 2215 maços de cigarros por mês dá uma média anual "per capita" de 177,2 maços;
  • é peciso ter em conta  que nem toda gente fumava: a prevalência de tabagismo entre homens com 15 anos ou mais anos de idade, em Portugal,  era estimada entre 40% e 50% em meados da década de 1970; 
  • portanto, aqueles de nós que fumavam, consumiam pelo menos um maço de cigarros por dia;

(iii) Coca-cola e sumos (refrigerantes):

  • 1680,5 latas ou embalagens num ano:  83,4 % corresponde à coca-cola... 
  • consumo anual "per capita" da coca-cola (=1402 x 12 =16824) seria de 112 latas; 
  • recorde-se que era uma bebida  proibida na metrópole, por teimosia de Salazar e das autoridades de saúde: além de ser vista  como um símbolo do ostensivo estilo de vida americano, haveria também um "argumento de saúde pública": além de poder ser facilmente associada à cocaína  ( e à "droga em geral"), o elevado teor de cafeína podia criar "habituação";
(iv) Uísque, gin, vodca, aguardente e outras bebidas destiladas:

  • temos um consumo mensal de 72,5 garrafas de 0,70l (ou de 0,75l, nalguns casos), o que dá 870 num ano;
  • a  maior parte é uísque de várias marcas =61 (84 %);
  • o restante: brandy (Macieira)= 4,5; gin = 6; vodca=1;
  • é mais difícil é saber o consumo destas  bebibas "brancas" (muito mais caras na metrópole) porquanto havia quem comprasse uísque  (mas também conhaque) para fazer "stock" e levar para casa, nas férias ou no final da comissão;
  • apesar de ser mais barato (no CTIG), o uísque (e o conhaque) era ainda um artigo de luxo para a maior parte da malta (as praças); mas era era também uma mercadoria muito apreciada; 
  • temos mais de 60 dezenas de garrafas de uísque vendidas por mês (720 por ano), incluindo o consumo avulso, na cantina (ao copo, com água mineral e gelo, se o houvesse) 
4. Mais difícil ainda é estimar o consumo de "álcool puro", per capita, anualmente...


(i) Vinho:

  • além destas bebidas (cerveja e bebidas brancas), os militares portugueses tinham direito a um copo de vinho à refeição; e  podiam também comprar na cantinha vinhos de marca como o Mateus Rosé ou o vinho verde branco Aveleda, Três Marias, Lagosta, etc.... (Vamos desprezar esses consumos, o vinho engarrafado era caro, a alternativa era a cerveja);
  • se cada militar bebesse 1 copo de vinho (200 ml) à refeição (almoço e jantar), ao fim de 365 dias seriam 140 litros;
  • admitindo que o vinho fornecido pela Intendência não ultrapassava os 10 graus, temos, um volume de álcool puro de 14 litros... (o vinho era mau e "batizado". toda a gente se queixava):

(ii) Cerveja:

  • sabendo que a cerveja Sagres tinha/tem 5º de teor alcoólico, o valor de 108,3 l consumido anualmente por cada militar correspondia a 5,415 l de álcool puro;

(iii) Bebidas destiladas:

  • o consumo anual médio, por companhia, poderia ser estimado (por baixo...) em  870 garrafas (0,70l, a 40º de teor alcoólico);
  • a dividir por 150  homens corresponderia a  5,8 garrafas (pouco mais de 4 litros);
  •  4060 ml x 0,40 (grau alcoolíco, médio)  = 1624 ml de álcool puro;


(iv) Álcool puro:

  • Somando o vinho (14 l), a cerveja (5,4 l) e as bebidas destiladas (1,6), são 21,0  litros no mínimo de álcool puro "per capita";
  • claro que aqui temos a velha história da falácia da média estatística: metade não fumava, mas grande parte bebia; o álcool era uma necessidade fisiológica e psicológica... nas condições de isolamento e de guerra em que se vivia.

5. Agora com a ajuda da Gemini IA /Google, acrescente-se em jeito de comentário:

  • de acordo com as estimativas mais recentes do SICAD (Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências), referentes a 2019, o consumo anual per capita de álcool puro em Portugal (para a população com 15 ou mais anos) era de 12,1 litros;
  • este valor inclui o consumo de vinho, cerveja e bebidas destiladas, tanto o consumo registado como uma estimativa do consumo não registado, e exclui o consumo por turistas;
  • note-se que Portugal apresenta um dos consumos de álcool "per capita" mais elevados entre os países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico).

De qualquer modo estes números, nomeadamente  sobre o consumo de bebidas alcoolólicas, têm que ser lidos e analisados com muitas reservas. 

Baseámo-nos no consumo de um só mês (maio de 1970) e de uma única subunidade de 150 homens (CCAV 2483, aquartelada na região de Quínara)... 

Os resultados são extrapolados... Precisamos de os confrontar com outros dados de outras fontes de informação (balancetes das cantinas de outras companhias, fornecimento mensal / anual da Intendência, etc.). 

Em todo o caso, estes números (***) ajudam-nos a ter uma ideia aproximada da "nossa grande sede", a  que pássavamos/passámos no CTIG, ao longo dos 22, 23, 24 meses de comissão... 

O tema do álcool em tempo de guerra é delicado mas não é tabu... Temos 45 referências a este descritor no nosso blogue. Mais de dois terços da nossa malta bebia, com maior ou menor moderação... E alguns já aqui admitiram, sem bravata nem falso pudor, que sim, que também lá apanharam alguns "pifos... daqueles de caixão à cova"... (AS/LG)
 __________________

Notas do editor LG:


(*) Vd. poste de 18 de janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5672: Estórias avulsas (23): Old Parr e Antiquary a 90$00 (Luís Dias)

(**) Vd. poste de 4 de maio de 2025 > Guiné 61/74 - P26764: (Ex)citações (432): Gosto de arquivar para mais tarde recordar e por vezes surpreender os amigos com peripécias vividas há anos (Aníbal José da Silva, ex-Fur Mil Vagomestre)

Vd. também 2 de maio de 2025 > Guiné 61/74 - P26754: (In)citações (269): Quem se lembra destes preços? (Aníbal José da Silva, ex-Fur Mil Vagomestre)

(***) Último poste da série > 2 de abril de 2025 > Guiné 61/74 - P26644: A nossa guerra em números (28): Ainda a nossa 'adorável' ração de combate, nº 20...(que dava 3 refeições para um homem, por dia, no mato)

terça-feira, 15 de abril de 2025

Guiné 61/74 - P26691: História de vida (57): o fur mil vagomestre António Fonseca que acabou por ter uma morte trágica no Algarve, em Albufeira, com a toda a família em 2009 (Luís Dias, ex-alf mil op esp, CCAÇ 3491, Dulombi e Galomaro, 1971/74)



Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Sector L5 (Galomaro) > CCAÇ 3491 (1971/74) > Dulombi > "O ex-furriel mil vagomestre Fonseca é o segundo a contar do lado esquerdo (com o seu aprimorado bigode)". (Da esquerda para a direita, furriéis Almeida, Fonseca, Gonçalves, E.Santo, 1º srgt . Gama, cap Pires, alf Luís Dias e Parente,  furriéis Machado (já falecido), Rodrigues e Reis; em pé, da esquerda para a direita,  fur Baptista, os 2 impedidos da messe,  furriéis Nevado e Carvalho.



Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Sector L5 (Galomaro) > CCAÇ 3491 (1971/74) > Dulombi > 1972 > "À porta da messe dos oficiais e sargentos: da equerda para a direita,  fur Fonseca (o nosso vagomestre), fur Batista (com a cara meio tapada), fur Gonçalves (só se vê a cara), fur Rodrigues (o nosso especialissimo mecânico auto rodas) e em primeiro plano o 1º srgt Raul Alves... Foto gentilmente cedida pelo camarada Manuel Rodrigues, ex-fur mil mecânico auto, que mantinha as nossas viaturas sempre operacionais".


Fotos (e legendas): © Luís Dias (2009). Todos os direitos reservados.[Edição e legendagem complementar de: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



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Crachá da CCAÇ 3491 / BCAÇ 3872 (Dulombi e Galomaro,  dez 71 - mar 74)




Luís Dias
1. Mensagem de Luís Dias, o nosso especialista em armamentp, ex-alf mil op esp, CCAÇ 3491 / BCAÇ 3872 (Dulombi e Galomaro,  dez 71 - mar 74), inspetor da Polícia Judicionária reformado (tem 107 referências no nosso blogue que integra desde 30/5/2008):


Data - domingo, 13/04/2025, 21:52
Assunto -  O nosso vagomestre António Fonseca 
 

Caro Luís Graça:


Na CCAÇ 3491/BCAÇ 3872, que esteve na Guiné entre 24 de dezembro de 1971 e 28 de março de 1974, tínhamos como vagomestre o furriel miliciano António Fonseca. 

A CCAÇ 3491 foi colocada no Dulombi, Leste da Guiné, estando:

  •  isolada vários quilómetros da CCS (Galomaro - a cerca de 20km);
  • a sul,  a CCAÇ 3490 - Saltinho (não havia estrada ou picada para este aquartelamento, ida do Dulombi, pelo que a volta para lá chegar era ir através de Bambadinca, Xitole (150 km);
  • a norte,  ficava a CCAÇ 3489, com picada/estrada indo por Galomaro (40 km);
  • à nossa frente ficava o Rio Corubal (40 km), zona para a qual efetuávamos a maior parte das operações. 

Estávamos isolados. A comida não era e nunca foi grande coisa e estávamos sempre a apertar com o vagomestre (*). Ele raramente  participava nas colunas semanais que fazíamos a Bafatá e Bambadinca para ir buscar abastecimentos. 

Certa vez, um dos bidões de azeite, depois de abertos no quartel, estava adulterado por água (alguém "palmara" azeite e completara o bidão com água). Aliás houve também casos de adulteração de garrafas de uísque. Não se sabendo se a adulteração já vinha da metrópole ou era feita em Bissau. 

O capitão reagiu e passou a obrigar o  furriel a ir em todas as colunas de abastecimento para verificar os carregamentos. 

O furriel para se desenrascar teve de pedir alguns litros de fornecimento de azeite às outras companhias do batalhão, com a promessa de os devolver o mais breve possível. 

Houve um período, em 1972, em que devido às chuvas as colunas não conseguiam passar porque a picada ficou intransitável em vários pontos e também não se conseguiu largada de frescos pela aviação, pelo que houve que recorrer a rações de combate e até pagar a caçadores indígenas a compra de caça variada obtida.

Entretanto, a nossa companhia foi transferida praticamente toda para a sede do Batalhão, em Galomaro, isto em 9 de março de 1973 (quando era eu o comandante da mesma, porque o capitão estava de férias), deixando no Dulombi 2 pelotões de milícias e 13 elementos de apoio (1 auxiliar de enfermagem, pessoal de transmissões, cozinheiros, condutores, mecânicos, apontadores de morteiros 81 mm, professor da escola dos miúdos, etc.), comandados por um dos meus furriéis e tendo como adjunto o furriel de transmissões. 

Esta saída inopinada deveu-se a um forte ataque sofrido pela CCS, no dia 1 de dezembro de 1972 e depois de 2 ataques anteriores rechaçados muito bem no Dulombi e ter surgido o general, Comandante-chefe,  e o nosso comandante de Batalhão,  em visita inopinada ao Dulombi, onde tive de explicar a atividade operacional que realizávamos e os resultados obtidos.

Em Galomaro, a situação era diferente e passámos a depender, em termos de comida, da organização já montada para a CCS, pelo que o nosso furriel vagomestre foi enviado para Bissau, para ser o representante do Batalhão na administração de abastecimentos. 

A companhia a 3 grupos de combate (o outro grupo foi reforçar o batalhão de Piche) ficou a efectuar operações na zona de Galomaro e também na zona do Dulombi (ficámos com mais do dobro do território anterior). 

Depois de ser enviado com o meu grupo para Piche (onde se  comia muito bem - oficiais e sargentos, mas muito mal os soldados, o que me levou a ter problemas com o comandante), ainda estive a comandar o CIM de Bambadinca, depois fui para Nova Lamego, onde estava o meu grupo de combate e depois fui para Pirada, onde estive poucos dias, voltando a Nova Lamego. Nestes três últimos locais, em termos de comida, não posso dizer mal.

Em inícios de janeiro de 1974, recebi ordens de regressar ao Dulombi, onde voltei a reunir-me com a companhia (todos os elementos de apoio, onde estava também o furriel vagomestre, entretanto regressado de Bissau), porque os outros grupos de combate estavam 2 em Galomaro e 1 em Nova Lamego. 

Nesta altura fui incumbido de ser o responsável por realizar a parte operacional com os grupos de combate da nova companhia que vinha nos substituir (a 1ª CCAÇ/BCAÇ 4518).

Nessa preparação havia o cuidado de verificar se na nossa zona da frente (lado de onde normalmente partiam os ataques do PAIGC) havia material que tivesse ficado por explodir, para o neutralizar.

Aqui chegado, devo referir que o amigo António Fonseca tinha muito "respeitinho", direi mesmo receio,   de alinhar na parte operacional, o que se compreende, porque não lhe competia. Deste modo, se houvesse uma coluna de abastecimentos de 10 viaturas ele seguia na décima, se fosse de 3 ou 4 viaturas ele seguia sempre na última, com o justo receio de que podia apanhar com alguma mina A/C.

Tinha detetado,  a cerca de 100 metros do nosso arame farpado, uma granada de morteiro 81 mm GEGP que fora disparada num dos ataques que o quartel sofrera e que não explodira. 

Escavei uma defesa de terra, em relação ao quartel, coloquei um petardo de TNT 100g, com detonador eléctrico, junto à granada, sem lhe tocar e estendi o fio até ao quartel e coloquei-me por trás do edifício do comando e avisei as torres de sentinela, bem como o pessoal da companhia para que se protegesse e acionei o detonador. 

Deu-se a explosão e pronto, estava feito. De repente, reparo que,  em frente à messe de oficiais e sargentos, estava o nosso amigo vagomestre com a mão na cabeça e olhar incrédulo. Então não é que o furriel, em vez de se esconder por trás do edifício, ficou, sem proteção,  a ver a explosão, não tendo ligado às instruções que eu dera ?!...

O furriel António Fonseca, um recatado militar, que punha todos os cuidados quando era obrigado a sair em coluna, ficou de peito feito a ver o que acontecia. 

A sorte protege os audazes e foi o que aconteceu. A cabeça da granada de morteiro veio de lá, e caiu a cerca de 2 metros dos seus pés. Passado quase uma hora ainda estava quente, um pouco mais e tinha atingido o nosso vagomestre, e podia-lhe ter tirado a vida.

Os anos passaram e a companhia voltou a reunir-se em convívios, 25 anos após a nossa chegada à metrópole. Contávamos histórias, episódios acontecidos e lá vinha sempre à memória o que podia ter acontecido ao furriel vagomestre e dizíamos que "sorte tiveste". 

Contudo, uma horrível notícia, referia uns anos depois, que na Praia da D. Luísa, um grupo de pessoas tinha ficado debaixo de uma arriba que desabou. O infortúnio tinha acontecido, o nosso amigo e companheiro furriel António Fonseca, juntamente com a sua esposa e filhas,   eram algumas das vítimas do funesto desastre (**).

Que possam as almas desta família estar no eterno descanso.
Abraço
Luís Dias

_____________

Notas do editor LG:

(*) Último poster da série > 13 de abril de 2025 > Guiné 61/74 - P26681: Histórias de vida (56): Berta de Oliveira Bento, a Dona Berta da Pensão Central, Bissau (1924 -2012)

(**) Vd. poste de Blogue > Histórias da Guiné 71-74: A CCAQÇ 3491, Dulombi > Sábado, 29 de agosto de 2009 > Morte trágica de um camarada

(...) Caros Camaradas: cumpre-me a dolorosa missão de vos informar da morte trágica do camarada José Batista Mota Fonseca,  o nosso ex-furriel vagomestre. O Fonseca perdeu a vida juntamente com a sua esposa e as duas filhas, na derrocada que se deu no passado dia 21, na Praia da Maria Luisa, em Albufeira, onde se encontrava a passar férias.

Este triste acontecimento foi-nos participado pelo nosso camarada ex-furrriel Carvalho.
À família enlutada as nossas sentidas condolências.
Descansa em paz,  querido amigo.

Luís Dias (...)
 

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2025

Guiné 61/74 - P26515: S(C)em Comentários (59): Ainda a Op Trampolim Mágico, desembarque anfíbio na margem direita do rio Corubal (Luís Dias, ex-alf mil, CCAÇ 3491 / BCAÇ 3872, Dulombi e Galomaro, 1971/74



Luís Dias

1. Comentário do poste P26513 (*):

A primeira grande operação em que me vi envolvido, quando comandava o 2º Gr Comb da CCAÇ 3491, integrado, juntamente com o 3º Gr Comb  também da minha companhia, no agrupamento "Castanho". 

Recordo que estivemos estacionados dentro de uma LDG, no meio do rio Geba, durante grande parte do dia, na véspera da Operação, que fomos atracar a Porto Gole, para pernoitar (onde penso ter bebido as cervejas mais frescas da minha vida, tal a sede). 

Que no dia seguinte, dentro da LDG lançada 
a toda a força,  fomos desembarcar na Ponta Luís Dias (engraçado ter o meu nome, mas, é claro, não tem a ver comigo), apoiados pelo fogo de artilharia da LDG e o bombardeamento dos aviões da FAP, estando a assistir ao desembarque o General Spínola. 

A operação foi decorrendo e devido a termos ficados parados, expostos ao sol (escaparam a este sacrifício os 2 Gr Comb  da nossa companhia, que eram os últimos do agrupamento e que, depois de ter perguntado ao Capitão que dirigia o agrupamento, o que se estava a passar - parados à espera de ordens (?)- decidi colocar os homens em locais junto de árvores que os protegessem do intenso calor. 

Interessa lembrar que a operação estava a ser levada a cabo, essencialmente, por forças do BART 3873 e BCAÇ 3872, que estavam na Guiné há pouco tempo e ainda não habituados a excessivo calor. 

A operação poderia ter corrido muito mal face à falta de água que se fez sentir, a diversas evacuações de pessoal desidratado e outros acontecimentos que não vou lembrar, porque a falta de água transtorna o cérebro de uma pessoa. 

O IN apercebeu-se da quantidade de homens e material empregue na operação e foi fugindo da zona deixando para trás velhos, mulheres e crianças, que foram levados pelas nossas forças. 

Não tivemos qualquer contacto e o IN apenas durante a noite lançou, à toa, morteiradas, com o intuito de conseguir saber onde estávamos instalados para dormir, mas sem, felizmente, qualquer sucesso e as tropas também decidiram não responder, para que eles não nos conseguissem localizar. 

A operação para o nosso agrupamento terminou em Mansambo, sendo recebidos pelo pessoal desse aquartelamento com jerricãs cheios de água, recebidos como um grande petisco, por todos nós.

Luís Dias, ex-alf mil,  CCAÇ 3491/BCAÇ3872 (Dulombi/Galomaro/Piche/Bambadinca/Nova Lamego/Pirada/Dulombi/Cumeré) | 
Guiné 24dez1971/28mar1974.


(Seleção. revisão / fixação de texto: LG)



Guiné > Carta de Fulacunda (1955) (Escala 1/50 mil) > Posições relativas das NT (a negro): Fulacunda, Ganjauará, Porto Gole e sector L1  (Bambadinca, Xime, Mansambo e Xitole) e do PAIGC (a vcrmelho): Ponta do Inglês, Ponta Luís Dias, Mangai, Mina / Fiofioli....

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2025)


Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Sector L1  (Bambadinca) > 1969/71 > Croqui do Sector L1 > Vd. as posições do PAIGC ao longo da margem direita do rio Corubal: Poindom / Ponta do Inglês (1 bigrupo); Ponta Luís Dias (1 bigrupo); Mangai (artilharia e bazucas): Mina / Fiofioli (base principal, 2 bigrupos); Galo Corubal / Satecuta (1 bigrupo)... As NT tinham unidades de quadrícula em Bambadinca (+ 1 CCAÇ 12, em intervenção), Xime, Mansambo e Xitole (BCAÇ 2852 e depois BART 2917).

Fonte: História da CCAÇ 12: Guiné 69/71. Bambadinca: Companhia de Caçadores nº 12. 1971

Infografia: © Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné Luís Graça (2005). Todos os direitos reservados
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Notas do editor LG:

(*) Vd. poste de 20 de fevereiro de 2025 > Guiné 61/74 - P26513: Imagens das nossas vidas: CART 3494 (1971/74) (Jorge Araújo / Luciano Jesus) - Parte III: A CART 3494 no Xime para render a CART 2715

(**) Último poste da série > 9 de fevereiro de 2025 > Guiné 61/74 - P26477: S(C)em Comentários (58): A "Primavera Marcelista" ?...é um mito: eu estava em Coimbra e e apanhei em pleno a crise académica de 1969 (Fernando de Sousa Ribeiro, ex-alf mil at inf, CCAÇ 3535 / BCAÇ 3880, Zemba e Ponte do Zádi, Angola, 1972/74)

domingo, 8 de dezembro de 2024

Guiné 61/74 – P26246: Armamento (12): Apresentação do livro "G3 - A Grande Arma Nacional" (Luís Dias)

1. Mensagem do nosso camarada Luís Dias (ex-Alf Mil da CCAÇ 3491/BCAÇ 3872, Dulombi e Galomaro, 1971/74):

Apresentação do livro "G3 A GRANDE ARMA NACIONAL"

Camaradas,

Estive ontem presente no lançamento deste livro e escrevi um pequeno texto sobre o evento. Se achares de interesse e útil para colocares no "Luís Graça & Camaradas da Guiné", estás à vontade. Grande abraço. Luís Dias

Ontem, por convite do autor, tive o grato prazer de assistir no Palácio dos Marqueses do Lavradio, no Campo de Santa Clara, em Lisboa, ao lançamento do livro, “G3 A GRANDE ARMA NACIONAL”, de Pedro Manuel Monteiro, editado pela “Conta Corrente”, onde dei um pequeno contributo sobre as diferenças em combate entre a HK G3A3 e as Kalashnikov, nos modelos AK-47, AKM e outros modelos das mesmas fabricados por países do Bloco Leste e pela China, que apoiavam na Guiné o PAIGC, que se enfrentavam no meu tempo de combatente na Guiné (1971-1974).

Na presidência da mesa encontrava-se o Vice-Chefe do Estado-Maior do Exército, o Tenente-General, Paulo Emanuel Maia Pereira. Na assistência diversos oficiais generais, oficiais superiores, quer ainda no activo, quer na reforma e muitos civis, entre eles, antigos funcionários do extinto INDEP.

No discurso do Tenente-General, houve um momento em que foi referida a presença e foi aplaudido de pé, uma pessoa por quem tenho grande admiração, o Coronel Tirocinado Comando, Raúl Folques que, no meu tempo de Guiné, foi o Comandante do Batalhão de Comandos, cargo onde substituiu o então Major Almeida Bruno e que, como se sabe, fez parte da 1ª companhia de comandos formada em Angola e que é um dos heróis de Portugal.

Nos anos da Guerra de África a espingarda automática HK G3 (também designada de espingarda de batalha, devido ao calibre potente que utilizava - 7,62x51mmNATO - e no formato convencional), terá passado pelas mãos de perto de um milhão de portugueses e foi a arma que Portugal escolheu, a partir de 1961, para enfrentar os movimentos independentistas nas províncias ultramarinas, iniciando-se em Portugal a sua produção, sob licença da Alemanha (então RFA), em 1962, e a sua atribuição oficial às forças armadas a partir de 1963. 

Foi esta espingarda, encimada no cano por um cravo, que se revelou um símbolo da Revolução de 25 de Abril de 1974, para toda a gente.

Após o fim da guerra em África, esta arma continuou a ser importante nas missões atribuídas às nossas forças armadas pela ONU ou no âmbito da UE, em diversas partes do mundo (Timor, Letónia, Roménia, República Centro-Africana, Moçambique, Guiné-Bissau, Somália, Mali, Afeganistão, Alemanha, Polónia e Kosovo).

As fábricas FMBP e INDEP terão produzido 442 197 G3, entre 1963 e 1988, segundo Relatórios de Contas destas fábricas referidos no livro em apreço e que serviu no nosso país por cerca de 60 anos, estando a ser substituída no Exército pela FN SCAR, modelo L e H e na Armada pela HK416. A G3, em conjunto com o mosquete “Brown Bess” de 1808, é arma recebida em maior quantidade pelo Exército Português, bem como uma das que é usada há mais tempo. 

A G3, era e é uma excepcional arma de guerra, com um projéctil poderoso – o 7,62x51mmNATO, que depois de ter sido trocado pelo calibre 5,56mmNATO, está novamente a ser recuperado, para novas gerações de espingardas de batalha e que tinha um som característico e forte que dava confiança a quem a usava. 

A G3 necessitava de alguns cuidados na limpeza (cabeça da culatra), mas em geral trabalhava bem, mesmo nas condições adversas em que foram utilizadas em África. Tinha o senão de ser uma arma grande e pesada para o tipo de guerra de guerrilha que enfrentávamos, mas também tinha um alcance útil superior às armas do inimigo e era também mais estável e precisa no tiro que as armas adversárias. 

O seu depósito de munições tinha uma capacidade inferior ao da kalashnikov mas, por outro lado, tinha um perfil mais baixo, evitando que o utilizador se elevasse demasiado, quando na posição de deitado, diminuindo significativamente a silhueta e, ao contrário da kalashnikov que possuía um carregador curvo e comprido, não tinha necessidade de se torcer para introduzir um novo carregador na arma. Também o comutador do tiro era mais simples de utilizar do que da arma preferencial rival e era silencioso, ao contrário do da AK-47 e AKM que faziam ruídos de clic, na movimentação para tiro a tiro e para fogo de rajada, o que no mato podia fazer a diferença.

O mecanismo operativo da espingarda automática HK-G3, apresentado em 1959 na então RFA é originário e semelhante ao da StG45 (Mauser) alemã, de 1945 e da CETME espanhola de 1952. O seu funcionamento é por inércia, actuando os gases sobre a superfície interna do invólucro e a culatra retarda a sua abertura (“Roller-delayed blowback”) pela acção conjunta dos roletes de travamento (alojados na cabeça da culatra), da massa da culatra e da mola recuperadora. O percutor está alojado no interior do bloco da culatra, dando-se a percussão pela pancada do cão (existente ao nível do gatilho) sobre a cauda do percutor. A alimentação é garantida pela mola do depósito (carregador). O extractor de garra, situado na cabeça da culatra, efectua a extracção da cápsula detonada no movimento de abertura da culatra e a ejecção dá-se quando a base da mesma encontra (ao nível do punho), um ejector de alavanca. Após o consumo das munições do depósito, a culatra não fica retida à retaguarda, como na FN FAL.

No tempo da Guerra de África, era conhecido o “amor” entre o combatente e a sua G3, apelidando-a, de “namorada”, a “minha querida”, a “minha amada” ou também por algum nome feminino de alguma mulher pela qual estivessem encantados. De facto, a maior parte dos militares dormiam com ela sempre ao lado, fosse no mato ou no quartel. Outros, fotografavam a arma e colocavam os dizeres “devo-te a vida”.

Luís Dias
ex-Alf Mil da CCAÇ 3491/BCAÇ 3872
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Nota do editor

Último poste da série > 
12 de novembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21534: Armamento (11): Material apreendido ao PAIGC em 1972 e 1973, em Galomaro e Dulombi (Luís Dias, ex-alf mil, CCAÇ 3491, Dulombi e Galomaro, 1971/74)

terça-feira, 30 de janeiro de 2024

Guiné 61/74 - P25122: Armamento do PAIGC (9): A pistola-metralhadora Sudaev PPS-43, também conhecida por PM de Ferro, PM Chinesa, Decétris




Sudaev PPS-43



Sudayev (em russo e em inglês) PPS-43. Fonte: Wikipedia (em inglês)

Segundo o nosso especialista m armamento, Luís Dias (*), a pistola-metralhadora Sudaev (Ou Sudayev) foi fabricada na II Guerra Mundial pela URSS, com o desenho de Sudaev, entre 1943 e 1946 (perto de 2 milhões de PM), e era uma arma mais compacta que a sua antecedente, sendo distribuída às unidades blindadas e paraquedistas. 

Alguns autores afirmam tratar-se da melhor PM da II Guerra Mundail. Após a guerra foi exportada para muitos países e foi muito copiada. Era conhecida pelos guerrilheiros como a “Decétrin”. Segundo o nosso camarada A. Marques Lopes. era conhecida na gíria do PAIGC por várias expre4ssões: PM de Ferro; Decétris; Modelo Patchanga; PM Chinesa). (**)

Características da arma 
  • Tipo: Pistola-metralhadora
  • País de Origem: URSS
  • Calibre: 7,62 mm Type P
  • Ano de fabrico inicial: 1943
  • Alcance eficaz: 200 m
  • Alcance prático: 25 a 50 mPESO: 3,67 Kg com o carregador completo
  • Comprimento: 831 mm
  • Munição: 7,62X25 mm Tokarev
  • Velocidade de saída do projéctil: 500 m/s
  • Alimentação: Carregador curvo com 35 projécteis
  • Segurança: Colocada à frente do guarda mato, travando a culatra
  • Funcionamento: Arma de disparo unicamente automático, funcionando por inércia da culatra, partindo da posição recuada/aberta
  • Cadência de tiro: 500 a 600 tpm

Observações: A Sudaev 'versus' FBP 

A nossa pistola-metralhadora FBP não era uma arma fiável, porque tinha a mola de soltura do carregador numa posição que poderia fazer com que alguém, mais nervoso, empunhando mal a arma, carregasse na mola inadvertidamente, soltando o carregador e se desse ao gatilho não sairia nenhum projéctil. 

Por outro lado, o sistema de segurança não era famoso, porque em caso de queda da arma, poderia dar-se o disparo da mesma (aconteceu-me no Dulombi, em que a arma caiu no quarto e efectuou um disparo inadvertido que, felizmente, não teve consequências). 

Por estas razões, esta arma, no período em apreço, na guerra colonial, não era muito utilizada em termos operacionais.(***)
 
No TO da Guiné, a Sudaev aparecia em poucas quantidades e era tecnicamente superior à Shpagin (****), embora só produzisse disparo automático, compensando, contudo, por ter uma cadência bem mais baixa.


Munição 7,62x25 mm Type P/Tokarev, utilizada na pistola TT33 e nas Pistolas-metralhadoras PPSh-41 e PPS-43

Munição 9x19 mm Parabellum ou Luger, utilizada na pistola Walther P-38 e nas pistolas-metralhadoras ao serviço das forças armadas portuguesas, como a FBP.
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 23 de janeiro de 2010 > Guiné 63/74 – P5690: Armamento (2): Pistolas, Pistolas-Metralhadoras, Espingardas, Espingardas Automáticas e Metralhadoras Ligeiras (Luís Dias)

segunda-feira, 29 de janeiro de 2024

Guiné 61/74 - P25120: Capas da Vida Mundial Ilustrada (1941-1946) - Parte I: embarque de tropas expedicionárias para Cabo Verde, em junho de 1941.... "Partiram alegres e confiantes"...





Legenda (não há idicação do autor da foto):  "Partiram alegres e confiantes os soldados que constituíam o último destacamento de tropas expedicionárias enviadas para o arquipélago de Cabo Verde". (Há aqui um lapso factual: depois deste embarque, em junho de 1941, houve pelo nenos um outro posterior, no mês seguinte, em 18 de julho, no T/T Mouzinho.) 


(A imagem foi reditada, com a devida vénia... LG)




(i)  surgiu em 22 de Maio de 1941, em Lisboa, em plena II Guerra Mundial;
(ii)  publicou-se até no final de 1946, totalizando 278 números;
(iii) teve como diretor José Cândido Godinho (Setúbal, 1890- Lisboa, 1950), e como editor e proprietário Joaquim Pedrosa Martins;
(iv) redação e administração: Rua Garrett, 80-2º Lisboa, telefone 25844.
(v) o nova publicação era apresentada como "documento vivo do que vai pelo mundo", um jornal que "pela ilustração, esclareça e informe e oriente o público - com esse poder de verdade que mais do que a palavra falada ou escrita, a imagem traduz".




Fonte: "Diário de Lisboa" (diretor: Joaquim Manso), sexta-feira, 18 de julho de 1941, p. 5, Cortesia da Fundação Mário Soares > Casa Comum > Arquivos > Diário de Lisboa / Ruella Ramos. (*)

Citação: (1941), "Diário de Lisboa", nº 6700, Ano 21, Sexta, 18 de Julho de 1941, CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_24851 (2017-8-29)

(Com a devida vénia...)


1. Lembrei-me, ao deparar-me com esta capa da "Vida Mundial Ilustrada", do "meu pai, meu velho, meu camarada", Luís Henriques (1920-2012) (*), que fez parte da força de 6 mil e tal homens que foram reforçar a defesa do arquipélago de Cabo Verde durante a II Guerra Mundial.  Esteve sempre no Mindelo, São Vicente, entre julho de 1941 e setembro de 1943.

Foram também como "expedicionários" para Cabo Verde outros pais de camaradas nossos, como o Hèlder Sousa, o Luís Dias e  o Augusto Silva Santos,  ou o nosso amigo, guineense, de origem cabo-verdiano, Nelson Herbert Lopes. Mas também o tio do Mário Fitas. o Joaquim José Fitas.

O meu pai, natural da Lourinhã,  era 1º cabo atirador de infantaria, 3ª Companhia do 1º Batalhão do RI5 (Caldas da Rainha), unidade mais tarde integrada no RI 23 (São Vicente, Cabo Verde, 1941/43). Partiu no T/T Mouzinho, em 18 de julho de 1941, do Cais da Rocha Conde de Óbidos. O Salazar fez questão de lá ir pessoalmente despedir-se das tropas expedicionárias.  Regressou doente, o meu pai, em setembro de 1943. Casou em 2/2/1946. E eu vim a nascer a 29/1/1947.

Quem foi na mesma data, 18 de julho de 1941,  e no mesmo navio, o Mouzinho,  foi o  sold aux enf, Porfírio Dias (1919-1988): lisboeta,  integrava 1º Batalhão Expedicionário do Regimento de Infantaria nº 5, a mesma unidade do meu pai.  Esteve lá dois anos anos e dez meses. É pai do nosso camarada Luís Dias.

Outro expedicionario foi o Ângelo Ferreira de Sousa (1921-2001), pai do nosso camarada Hélder Sousa, natural de Vale da Pinta, Cartaxo, ex-1º cabo n.º 816/42/5, da 4ª Companhia do 1º Batalhão de Infantaria do RI 23...   Esteve na Iha de São Vicente.

Por sua vez, na Ilha do Sal, entre junho de 1941 e março  de 1943, na 1ª Companhia do 1º Batalhão Expedicionário do RI 11, esteve o 1º cabo Feliciano Delfim Santos (1922-1989), pai do nosso camarada Augusto Silva Santos. Ele e os seus camaradas foram depois destacados para a ilha de Santo Antão (até dezembro de 1943).

O Nelson Herbert Lopes (que foi jornalista da VOA - Voz da América) também já aqui evocou o seu pai, Armando Duarte Lopes, uma antiga glória do futebol cabo-verdiano e guineense, Armando Búfalo Bill, seu nome de guerra, o melhor futebolista da UDIB e do Benfica de Bissau, tendo sido também internacional pela selecção da antiga Guiné Portuguesa:

(...) O meu velho entrou para a tropa a 15 de agosto de 1943. Fez a recruta e o treino militar em Chã de Alecrim [a nordeste da cidade do Mindelo, Ilha de S. Vicente, Cabo Verde].,Depois do juramento da bandeira (...) é transferido para Lazareto e São Pedro [na parte oeste, sudoeste da ilha].

Lembra-se perfeitamente do corpo expedicionário vindo da então Metrópole. Termina o serviço militar em janeiro de 1945. Frequenta , como vários outros nativos crioulos, o Curso de Sargentos Milicianos, graduação a que entretanto dificilmente os nativos hegavam... (...)  (**)

sábado, 27 de janeiro de 2024

Guiné 61/74 - P25115: Armamento do PAIGC (8): A pistola, de origem soviética, Tokarev TT-33


A pistola Tokarev TT-33


1. Segundo o nosso especialista de armamento, Luís Dias (*), a pistola Tula Tokarev TT-33 surgiu na antigaURSS, baseada no desenho da Colt-Browning e foi a pistola das forças da União Soviética durante a II Guerra Mundial, vindo posteriormente a ser fabricada pelos países do Pacto de Varsóvia e pela China até ser substituída pela Makarov, no calibre 9 mm Mk.

Foi a pistola usada pelas forças de guerrilha do PAIGC. (**)

Também há referências, no nosso blogue, às pistolas apreendidas pelas NT:

CESKA ZBROJOVKA Cal. 7,65 mm, pistola semiautomática;

CESKA ZBROJOVKA Cal. 6,35 mm, pistola semiautomática pequena.

Características da pistola Tokarev TT-33

  • TIPO: Pistola semiautomática
  • PAÍS DE ORIGEM: URSS, países do Pacto de Varsóvia e China
  • CALIBRE: 7,62 mm Type P
  • DATA DE FABRICO INICIAL: 1933
  • ALCANCE ÚTIL: 50 m
  • ALCANCE PRÁTICO: 5 a 10 m
  • PESO: 0,840 kg com carregador com 8 munições
  • MUNIÇÂO: 7,62x25 mm Tokarev
  • ALIMENTAÇÃO: 8 munições num carregador unifilar colocado no punho.
  • SEGURANÇA: A única segurança é feita pelo cão travado (half-cock) a meio de ser armado.
  • FUNCIONAMENTO: Pistola semi-automática, funcionando por recuo do cano e de acção simples. As forças do PAIGC possuíram ainda pistolas CZ, de origem Checoslovaca, nos calibres 6,35 mm e 7,65 mm.

Observações: Tokarev 'versus' Walther

A pistola Walther P-38, é uma arma de grande qualidade, muito robusta, tendo-se mantido ao serviço das forças armadas portuguesas ao longo de todos estes anos, embora se preveja vir a ser substituída em breve. É uma arma excelente para tiro prático, sendo nitidamente superior, quer no tipo de munição utilizada (9 mm Parabellum), quer no seu funcionamento, à Tokarev que, segundo alguns autores, encravava com alguma facilidade devido a problemas com o carregador. 

A Walther tem ainda a vantagem de funcionar por acção dupla (rapidez de disparo) ao contrário da Tokarev que funciona unicamente por acção simples.

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Notas do editior:

(*) Vd. poste de 23 de janeiro de 2010 > Guiné 63/74 – P5690: Armamento (2): Pistolas, Pistolas-Metralhadoras, Espingardas, Espingardas Automáticas e Metralhadoras Ligeiras (Luís Dias)

sexta-feira, 26 de janeiro de 2024

Guiné 61/74 - P25113: Armamento do PAIGC (7): A "patchanga", a pistola-metralhadora russa Shpagin PPSh-41 (conhecida como a "costureirinha" pelas NT)

 

Guiné > PAIGC > Novembro de 1970 > Um guerrilheiro (ou "elemento da população" ?) mpunhando uma PPSH (a irritante "costureirinha", uma arma temível sobretudo em emboscadas muito próximas das NT)...

Fonte: © Nordic Africa Institute (NAI) / Foto: Knut Andreasson (com a devida vénia... e a autorização do NAI)

1. Segundo o nosso especialista de armamento, Luís Dias, "a pistola-metralhadora PPSh-41, concebida por Georgii Shpagin, conhecida pelas nossas forças como a Costureirinha, e pelo PAIGC como a Patchanga, foi uma das PM mais fabricadas no mundo (mais 6 milhões de exemplares), e largamente utilizada pelo exército soviético na IIª Guerra Mundial. No pós-guerra foi usada nos países satélites, na China, Vietname e nos movimentos de libertação africanos".

Características técnicas da arma:

  • Tipo: Pistola-metralhadora
  • País de origem: ex-URSS
  • Calibre: 7,62 mm, Tipo P
  • Ano inicial de fabrico: 1941
  • Alcance eficaz: 200 m
  • Alcance prático: 25 a 50 m
  • Peso: 5,45 Kg com tambor de 71 munições; 4,30 Kg com carregador de 35 munições
  • Comprimento: 843 mm
  • Munição: 7,62x25 mm Tokarev
  • Velocidade de saída do projectil: 488 m/s
  • Alimentação: Tambor de 71 munições ou carregador curvo de 35 munições
  • Segurança: Através de travamento da culatra na posição recuada ou quando fechada.
  • FUNCIONAMENTO: Arma de disparo selectivo de tiro (auto ou semi-auto), funcionando por inércia da culatra, através da posição aberta
  • Cadência de tiro: 900 tpm

Ainda segundo Luís Dias: 

(...) "A célebre 'costureirinha' dava fama ao nome devido ao 'seu cantar' muito próprio (elevada cadência de disparos). Era uma arma pesada, com uma munição não muito potente e com problemas de falhas no funcionamento, quando utilizava o tambor, tornando-se incómoda no transporte, face à sua configuração e devido à sua elevada cadência, consumia muitas munições, não sendo também muito precisa." (...)

    Ver mais informação sobre esta arma, na Wikipedia.

    (...) O carregador de tambor, com capacidade para 71 cartuchos, era frágil, sofrendo deformações com facilidade, causando encravamento, sua alta cadência de tiro, e facilidade de disparo faziam com que rapidamente se gastassem as munições disponíveis, o que provocava inevitavelmente problemas logísticos aos movimentos guerrilheiros. Por conta disso foi introduzida uma versão de carregador de 35 munições, muito mais confiável que pelo design mais simples. Além disso, em florestas densas, a sua relativa pouca potência tornava-a uma arma relativamente ineficiente. (...) 

    Esta talvez uma das razões por que os guerrrilheiros do PAIGC acabaram por preferir a Kalash...



Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Setor L5 (Galomaro) > CCAÇ 3491 (1971/74) > Chegada a Galomaro da CCAÇ 3491 / BCAÇ 3872, no dia 9 de Março de 1973. No jipe podemos ver o alf mil op esp Luís Dias, atrás o fur Baptista,  do 1.º Gr Comb,  e ao lado, a sorrir, um guerrilheiro do PAIGC que, no dia anterior, se tinha entregado a uma patrulha nossa na área do Dulombi. A arma é uma Shpagin PPSh- 41, no calibre 7,62 mm Tokarev, mais conhecida por "costureirinha" e com a particularidade de ter um carregador curvo de 35 munições, em vez do habitual tambor de 71. (Foto do Luís Dias, reproduzida com a devida vénia, do seu blogue, Histórias da Guiné, 71-74:  A CCAÇ 3491, Dulombi.

Foto (e legenda) © Luís Dias (2009). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].
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Nota do editor:

(*) Último poste da série > 18 de outubro de 2023 > Guiné 61/74 - P24766: Armamento do PAIGC (6): A mina antipessoal PDM-6 (António Alves da Cruz, ex-fur mil, 1ª C/BCAÇ 4513/72, Buba, 1973/74)

Postes anteriores:

8 de outubro de 2023 > Guiné 61/74 - P24735: Armamento do PAIGC (5): O sistema Grad, o "jacto do povo", a "mulher grande", o foguetão 122 mm: as expetativas, demasiado altas, de Amílcar Cabral

10 de maio de 2023 > Guiné 61/71 - P24305: Armamento do PAIGC (4): Morteiro pesado 120 mm M1943, de origem russa, usado nos ataques e flagelações a aquartelamentos das zonas fronteiriças, como Gandembel, Guileje, Gadamael, Guidaje, Copá ou Canquelifá

19 de abril de 2023 > Guiné 61/74 - P24234: Armamento do PAIGC (3): peça de artilharia 130 mm M-46, cedida pelo Sekou Turé para os ataques, a partir do território da Guiné-Conacri, contra Guileje e Gadamael, em maio/junho de 1973